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Questão do Saneamento Básico no País

Desde a Declaração Universal dos Direitos Humano (DUDH), de 1948, o acesso à água e ao saneamento básico deve ser entendido como indispensável para fazer ou dar efetividade aos diretos ali estabelecidos.

Hoje no país, cerca de 35 milhões de pessoas não contam com o abastecimento de água tratada e 104 milhões, praticamente metade da população, não têm coleta de esgoto. Para piorar, cerca de metade dos esgotos existentes não são tratados.

A falta ou a precariedade de sistemas de água e esgoto são fatores de reprodução de desigualdade e injustiça social em larga escala, pois, assim como reduzem a oportunidade de desenvolvimento e ascensão de milhões de famílias e indivíduos, sabotam a sustentabilidade socioambiental com impactos maiores em áreas habitadas pelos mais carentes.

O problema da desigualdade da distribuição não se limita nem se explica por características geográficas e populacionais que dificultam a provisão de serviços.

Infraestrutura inadequada, falta de manutenção, falhas na fiscalização, resultando em muita água perdida nas redes de abastecimento. Vale mencionar também, o desperdício na ponta, procedente de hábitos inadequados e falta de compromisso com a economia de água por parte dos consumidores.

Todas essas constatações ganharam ainda mais peso e relevância a partir da pandemia de Covid-19. A crise que a rápida disseminação do vírus causou revelou que a saúde publica deve ser priorizada e tratada pela sociedade e pelo poder público, como fator essencial de segurança socioeconômica e alicerce para o desenvolvimento das nações.

Segundo estimativas recentes, a universalização do saneamento no Brasil, requer investimentos totais na casa dos 700 ou 800 bilhões de reais. Mesmo que o Estado, conseguisse bancar sozinho essa conta ao longo da próxima década, a necessária ampliação dos serviços prestados diretamente pela administração pública implicaria em um vigoroso expansionismo estatal –  algo que colide frontalmente com as condições políticas e econômicas hoje dominantes no pais.

Impõe-se, portanto, a busca de soluções pragmáticas, que fortaleçam e aperfeiçoem o que já vem dando certo, atraiam e articulem, sem preconceito, todos os atores e recursos potencias – públicos, privados e híbridos – para, em sinergia, e com flexibilidade para diversos arranjos regionais e locais, atingir a meta do saneamento para todos.

Desde julho de 2020, com a aprovação do Novo Marco Legal do Saneamento Básico, a tarefa de promover saneamento para todos implica o enfrentamento de novos desafios e mudanças como:

·         Prover mais segurança jurídica para o setor, retirando obstáculos que possam dificultar a expansão dos serviços e atrair mais investimentos para viabilizar a universalização.

·         Abrir mercado para a iniciativa privada, estabelecendo limites e vetos para arranjos entre entes públicos, obrigando-os a substituir instrumentos para delegação dos serviços como ‘’contrato de programa’’ (forma de consórcio firmado entre instâncias estaduais e municipais para o provimento de serviços de saneamento) por concorrências para concessões abertas a empresas privadas.

·         Estabelecer e implementar metas e parâmetros técnicos, promovendo mais eficiência de gestão em todo o pais, concentrando atribuições e poder regulatório de fiscalização e controle na Agência Nacional de Águas (ANA), por meio de normas de referência.

A partir da aprovação do “Novo Marco”, a regra vigente prevê extrema centralização de decisão, coordenação e regulação na instancia federal, sobretudo na ANA, cujas normas terão de ser seguidas para que os projetos e sistemas de saneamento municipais e regionais possam ter acesso a recursos federais. Essa concentração excessiva de poder sobre todo o setor de saneamento deverá ser flexibilizada pelo Supremo Tribunal Federal, que, afastando as insconstitucionalidades do MLS, poderá garantir a autonomia dos municípios e estados da federação para escolher entre os modelos de prestação de serviços.

Vale ressaltar que, tanto o “Marco Legal” em vigor, quanto a evolução do mundo e do Brasil, trazem novas oportunidades e desafios, mas o fator decisivo para o grau de sucesso que teremos, será a nossa capacidade coletiva de mobilização, articulação e superação rumo ao saneamento para todos. O maior desafio para a universalização sustentável do saneamento no Brasil é o atendimento às regiões e populações mais pobres.

Devemos frisar que, para que os agentes públicos e privados incumbidos do planejamento, do investimento, da expansão da operação e manutenção dos sistemas de saneamento atuem com efetividade para incluir e atender satisfatoriamente as necessidades socioambientais das regiões e populações mais pobres, é indispensável a participação constante da sociedade civil, sobretudo, por meio de organizações e movimentos sociais, exercendo democrática pressão e constante controle popular.

A universalização do saneamento básico é um objetivo e um projeto que se articula com prevenção de doenças e promoção de saúde, combate à exclusão, à pobreza e à desigualdade, distribuindo oportunidades e estimulando o desenvolvimento socioeconômico, busca de equilíbrio ecológico, a proteção ambiental e preservação de recursos naturais. Trata-se, portanto, de um desafio cuja superação requer, não apenas para o fortalecimento da democracia, mas como determinante para que o país possa dar, efetivamente, esse passo fundamental rumo a um novo patamar de desenvolvimento.

Baseado no Livro “Saneamento para Todos” do autor Rubens Neves

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